
2 anos de monitorização – o consumo de energia
A Casa da Palmeira é a primeira Passive House certificada em Portugal como resultado duma reabilitação profunda. A obra foi concluída em janeiro de 2023, data em que começámos também a monitorizar o seu desempenho. Agora que passam 2 anos de monitorização da Casa da Palmeira quisemos analisar de forma mais profunda os consumos de energia reais e compará-los com os valores obtidos nas estimativas iniciais.
Sabemos então que temos um edifício de elevadíssimo desempenho, uma vez que tem um desempenho Passive House, obtido através da ferramenta Passive House Planning Package (PHHP), e que tem consumos baixíssimos de energia na sua operação, através dos resultados recolhidos pela monitorização.
Podem encontrar mais informação sobre o projeto e os resultados na base de dados de Passive Houses, no portfolio da Homegrid e nesta apresentação feita na 10ª Conferência Passivhaus Portugal.
Os dados do desempenho podem ser acedidos de forma livre na nossa plataforma de monitorização em tempo real, disponível aqui. Podem encontrar mais informação sobre a plataforma e sobre o acesso aqui. Na Casa da Palmeira estamos a monitorizar apenas 1 dos 2 fogos existentes.
Então, a Passive House funciona?
A monitorização para além dos consumos de energia (instantâneos e totais) também recolhe os dados das condições interiores (temperatura, humidade relativa e concentração de CO2) e exteriores (temperatura e humidade relativa).
No que respeita ao desempenho energético, são recolhidos os dados dos seguintes parâmetros:
- Consumo total de energia
- Consumo de energia para o aquecimento e arrefecimento (ar condicionado 1 unidade split 2,5 kW)
- Consumo de energia para as águas quentes sanitárias – AQS (bomba de calor 2,2 kW)
- Consumo de energia para a ventilação (unidade de ventilação mecânica com recuperação de calor; eficiência 82%; consumo elétrico 0,27 Wh/m3)
- Consumo de energia do frigorífico (221 kWh/ano)
- Consumo de energia da placa e do forno (6,3 kW, 2,6 kW respetivamente)
- Geração de energia (2 painéis fotovoltaicos 0,76 kW)
Nota: os dados recolhidos dizem respeito à utilização de 1 fogo. Para obtermos os consumos totais da casa, multiplicamos os valores por 2, considerando o mesmo perfil de utilização em ambos os fogos.
Climatização
Os consumos anuais de energia medidos para o aquecimento e arrefecimento são de 210,8 kWh/a. Não é possível separar os consumos de aquecimento dos de arrefecimento uma vez que é o mesmo equipamento a realizar as duas funções.
Os resultados estimados no balanço energético, através do PHPP, são de 923 kWh/a no total, sendo 866,2 relativos ao aquecimento e 56,8 ao arrefecimento. No PHPP foram consideradas as eficiências de aquecimento (fator de 2,65) e de arrefecimento (fator de 6,20) declaradas pelo fabricante da bomba de calor.
A diferença entre os resultados reais e os estimados poderá dever-se a diferentes fatores:
- Diferença entre as condições climatéricas do período da monitorização e os dados climáticos usados na simulação, sendo que estes últimos são dados climáticos históricos com médias de 30 anos.
Sabe-se que os anos de 2023 e 2024 foram anormalmente quentes, tendo 2023 sido o 2º ano mais quente e 2024 o 4º ano mais quente desde 1931.
Sabe-se também que, por exemplo, a temperatura média no mês de janeiro de 2024 em Ílhavo situou-se entre os 12° e os 14° C, sendo que os dados climáticos históricos apresentam uma temperatura média para o mês de janeiro em Ílhavo de 9,5° C (Boletim Climático Portugal Continental – janeiro 2024, IPMA)
- Diferentes padrões de conforto. Na simulação no PHPP as necessidades de energia são obtidas para ter uma temperatura mínima de 20° C no inverno e de 25° C de temperatura máxima no verão. Na operação do edifício é possível que estes limites não sejam cumpridos em permanência.
- Diferentes padrões de utilização de utilização dos fogos em relação ao padrão de utilização standard definido na simulação no PHPP.
AQS
Os consumos anuais de energia medidos para AQS são de 893 kWh/a. O consumo de energia de AQS nesta casa é o que tem o maior peso entre todos os consumos de energia.
Os resultados estimados no balanço energético, através do PHPP, são de 682 kWh/a. No PHPP foi considerada a eficiência de aquecimento com um fator de 4,08, de acordo com os valores declarados pelo fabricante da bomba de calor.
A diferença entre os resultados reais e os estimados poderá dever-se essencialmente aos diferentes padrões de utilização de água quente. No PHPP os valores padronizados para o consumo de água quente são de 25 litros por pessoa por dia de água a 60° C. Os resultados medidos, de acordo com o mesmo critério, equivalem a 38 litros por pessoa por dia de água a 60° C.
Ventilação
Os consumos anuais de energia medidos devido à ventilação são de 273 kWh/a.
Os resultados estimados no balanço energético, através do PHPP, são de 426 kWh/a.
A diferença entre os resultados reais e os estimados poderá dever-se essencialmente aos diferentes padrões de utilização e à programação dos diferentes steps de ventilação.
Cozinha
Os consumos anuais de energia medidos devido ao frigorífico são de 401 kWh/a.
Os resultados estimados no balanço energético, através do PHPP, são de 442 kWh/a.
Os consumos anuais de energia medidos para a confeção de alimentos são de 528 kWh/a.
Os resultados estimados no balanço energético, através do PHPP, são de 458 kWh/a.
A diferença entre os resultados reais e os estimados, sendo muito reduzida, poderá dever-se essencialmente à diferença no número de utilizações dos equipamentos.
Necessidades totais de energia
Os consumos anuais de energia medidos em toda a casa são de 3383 kWh/a.
Os resultados estimados no balanço energético, através do PHPP, são de 3834 kWh/a.
A diferença entre os resultados reais e os estimados situa-se em 13%, sendo justificada pelos fatores acima referidos,
Geração de eletricidade
A eletricidade anual gerada a partir dos dois painéis fotovoltaicos é de 1008 kWh/a.
Os resultados estimados no balanço energético, através do PHPP, são de 980 kWh/a.
A diferença entre os resultados reais e os estimados é praticamente nula, estando abaixo de 3%, portanto dentro da margem de erro normal.
Conclusões
- Esta Passive House tem necessidades totais de energia muito baixas. Por cada habitação, o consumo total de eletricidade é inferior a 1700 kWh/ano… o equivalente a um custo inferior a 1€ por dia… ou inferior a 30€ por mês.
- Os resultados da monitorização apresentam um consumo total de energia inferior àquilo que foi estimado sobretudo, devido sobretudo às menores necessidades de energia para a climatização que correspondem a 6% do total de energia consumida.
- As necessidades de energia para climatização (aquecimento + arrefecimento) nesta Passive House são extremamente baixas. Por exemplo o consumo elétrico do frigorífico é praticamente o dobro do consumo elétrico para a climatização.
- Verifica-se também que as necessidades de energia para AQS são o maior consumidor de energia nesta Passive House, correspondendo a uma fração superior a 1/4 de todo o consumo.
- A eletricidade gerada corresponde a cerca de 30% do consumo total medido, apenas com 2 painéis fotovoltaicos (potencia de 0,76kW) em regime de autoconsumo. A eletricidade que não é utilizada no momento da sua geração é enviada para a rede sem remuneração.
Em síntese, fica demonstrada a robustez e a fiabilidade da ferramenta PHPP para estimar as necessidades de energia dos edifícios e o potencial que o padrão Passive House tem para fazer a transição do parque edificado em Portugal para elevados níveis de desempenho.